O registro vocal no estudo do canto

Saber como transitar entre um registro vocal e outro é um dos passos fundamentais no aprendizado do canto. Mas você sabe o que é registro vocal?

Para exemplificar, imagine uma melodia que você aprecie e deseja aprender a cantar com beleza e afinação.

Qualquer intervalo de notas nessa música que exija mecanismos semelhantes de execução, será um registro vocal.

A mudança para outro intervalo, como ocorre na transição entre graves e agudos, requer uma boa coordenação entre músculos laríngeos.

Evento laríngeo

No livro “Músculos Intrínsecos da Laringe e Dinâmica Vocal”, os autores Sílvia Pinho, Gustavo Korn e Paulo Pontes consideram o registro vocal como um “evento totalmente laríngeo, consistindo de séries de frequências, ou em uma faixa de frequências vocais, que podem ser produzidas com qualidades aproximadamente idênticas”.

O nível de espessura das pregas vocais está intrinsecamente ligado à definição dos diferentes registros.

A musculatura laríngea no registro vocal

Registro vocal

Para compreender melhor esses conceitos, vamos entender um pouco sobre dois músculos intrínsecos laríngeos, os quais são fundamentais no canto.

O tireoaritenoideo interno (TAi), responsável pelo encurtamento das pregas vocais, é um deles e fica mais ativo nas notas graves.

Na hora de transitar para a “voz de cabeça”, aos poucos o TAi vai cedendo lugar para o cricotireoideo (CT), que é considerado um músculo de resistência.

Sua função é deixar as pregas vocais mais finas e esticadas.

Nesse “jogo” entre TAi e CT, em que um cede para dar espaço ao outro, há zonas de passagem, as quais podem gerar “quebras” em cantores ainda pouco treinados.

Tecnicamente, é uma das principais dificuldades enfrentadas no canto.

O ideal é que a passagem de um registro vocal a outro seja imperceptível ao ouvinte.

Inclusive, para quem canta, é possível sentir, na prática, onde as mudanças de registros ocorrem.

Quais são os registros vocais?

Registro vocal

Não há uma unanimidade entre estudiosos sobre a terminologia utilizada para quantificar e nomear os registros vocais. Mas, basicamente, existem três:

  • Basal: registro vocal onde são executadas as notas mais graves da voz humana. É também conhecido como “vocal fry”, cujo efeito corresponde a uma série rápida de crepitações sonoras, como se fosse um tipo de ruído. As pregas vocais estão encurtadas ao máximo e bastante espessas. Há predomínio quase que absoluto do TAi.
  • Modal: neste caso, há equilíbrio entre TAi e CT. É a região onde ocorrem as “quebras” nas zonas de passagem, se não houver uma boa sinergia muscular nas transições. Divide-se em sub-registros: peito, médio e cabeça.
  • Elevado: equivale a um intervalo de notas mais agudas, com grande predomínio do CT.

Espessura das pregas no registro vocal

A fonoaudióloga Silvia Pinho, uma das principais referências da pedagogia vocal, por sua vez, faz uma subdivisão ainda mais minuciosa a respeito do tema.

A especialista não utiliza terminologias como “voz de peito” ou “voz de cabeça”, muito disseminadas no ensino do canto.

Para ela, existem termos que se adequam melhor à mecânica da voz, baseados principalmente no grau de espessura das pregas vocais.

Confira, então, quais são os registros, de acordo com a fonoaudióloga:

  • Basal ou “vocal fry”.
  • Modal: subdividido em registros denso (equivalente à “voz de peito”), médio e tênue (“voz de cabeça”).
  • Elevado ou falsete: é similar à voz de cabeça, mas com volume mais reduzido e muita soprosidade na emissão. Outra dica para diferenciar “falsete” de registro tênue, é fazer um glissando do agudo ao registro médio. Ou seja, basta transitar de uma nota à outra de forma ininterrupta, como se estivesse “escorregando” na melodia. Do falsete para o médio, costuma ocorrer uma “quebra” na zona de passagem, algo que não acontece se o ponto de partida for o registro tênue.
  • Flauta: faixa de notas extremamente agudas, mas com grau mínimo de massa vibratória.
  • Assobio (whistle): neste registro, excepcionalmente, as pregas vocais não vibram e estão bem aduzidas (fechadas). Há apenas uma pequena fenda por onde o ar passa, gerando um som semelhante a um apito. A lógica é, portanto, similar à de um assobio feito com a boca, mas realizado pela laringe.

Áreas de ressonância

Quando não havia conhecimento das estruturas laríngeas, o registro vocal era definido de acordo com as regiões de ressonância. Ou seja, era todo baseado em sensações.

Ainda hoje, há quem utilize este método por questões didáticas. Ao cantar notas mais graves, muitos sentem a região torácica vibrar, daí o termo “voz de peito”. Já nas notas agudas, há relatos de vibração na cabeça, na nuca ou no nariz.

Contudo, essas sensações não são as mesmas para todos. E, como já se sabe, a voz não é produzida no peito ou na cabeça, mas na laringe.

O entendimento sobre a fisiologia do canto trouxe maior clareza a cantores, vocal coaches e fonoaudiólogos.

Hoje é possível executar técnicas com resultados estéticos mais precisos, associando exercícios da musculatura laríngea com ajustes no trato vocal.

Registro vocal na história

cantar no microfone

Quem começou a compreender melhor todo esse processo foi o pedagogo vocal espanhol Manuel Garcia (1805-1906).

Ele definiu, em 1847, o registro vocal como uma série de sons consecutivos e homogêneos, produzidos pelo mesmo princípio mecânico.

E isto foi graças à sua invenção, o laringoscópio. Por meio desse instrumento, o pedagogo conseguiu observar o funcionamento das pregas vocais.

Antes de Garcia, porém, já havia teorias acerca do registro vocal. No século XVIII, por exemplo, cogitava-se a existência de três registros nas mulheres e dois nos homens.

Já no século seguinte, quando Garcia apresentou ao mundo sua invenção, o compositor inglês Isaac Nathan enumerou quatro registros.

São eles a voz de peito, falsete, voz de cabeça e voz fingida, que não seria nem falsete e nem cabeça. Bem confuso, não?!

Em 1970, o médico Minoru Hirano, ao estudar a musculatura intrínseca da laringe, citou a existência de três registros: vocal fry, modal (ou pesado) e leve (ou falsete). O modal seria subdividido em peito, médio e cabeça.

O tema continua sendo objeto de estudos e teorias até hoje. Mas, se você deseja apenas aprender a cantar, não se preocupe com tantas nomenclaturas.

O mais importante é saber como transitar entre um registro vocal e outro, com os exercícios propostos pelo seu vocal coach.

Bons estudos!


Veja no vídeo abaixo a professora Luiza Lobo da Full Voice Studios demonstrando na prática como dominar as passagens de registros vocais:

Finalizamos por aqui, mas antes de nos despedir, deixaremos algumas sugestão de leitura que certamente irão agregar e muito nos seus estudos.

O que é solfejo e qual sua importância na música Indicamos também a leitura de A matemática dos melismas perfeitos.

Então é isso, gostou das nossas dicas? Participe nos comentários abaixo!

Obrigada e Volte sempre!

About Luciana Amaral

Luciana Amaral é cantora profissional, jornalista, revisora e redatora freelancer. Já participou de vários cursos de canto, como o Modern Mix Voice, do professor Caio Freire; Solte Seu Belting, do professor André Barroso; Canto Popular, durante o Curso Internacional de Verão da Escola de Música de Brasília (Civebra); e Congresso Online de Voz Cantada, realizado pela Faculdade Novo Horizonte e pela professora Flávia Caraíbas. https://www.instagram.com/luciana.amaral_cantora/

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