Melodia: o coração da música

Não importa o seu gosto musical, se você canta bem ou é desafinado. O fato é que você, eu e qualquer pessoa já cantarolou alguma melodia na vida. Aliás, várias.

E de tanto ouvirmos os hits dos músicos que apreciamos, decoramos tanto as melodias quanto as letras.

Mas, conceitualmente, o que é a melodia, afinal?

Vamos esmiuçar um pouco mais sobre esse assunto a seguir.

Conceito de melodia

microfone com um fone de ouvido sobreposto e ondas de sons compõe a fotografia.

Na teoria musical a melodia é definida como uma sucessão de sons dispostos horizontalmente.

E sobre ela podemos sobrepor outras notas, de forma vertical, formando acordes: é o que chamamos de harmonia.

O musicólogo russo Igor Vladimirovitch Spossobin, em sua obra “Manual de Harmonia”, traz uma definição mais ampla: “Melodia é o elemento mais importante do discurso musical e um recurso da sua expressão; ela se aglutina numa sucessão de sons de diferentes alturas, durações, sentidos métricos, dinâmicas e timbres”.

Bohumil Med, em seu clássico livro “Teoria da Música”, complementa: “A sucessão de sons que forma a melodia deve conservar relações lógicas sob o ponto de vista de altura e de ritmo”.

E aqui, vale um esclarecimento: na música, a altura se refere à quão grave ou aguda é uma determinada nota.

Construção melódica

professora de música treinando melodia musical com uma menina

Há diversas formas de construir uma melodia, que é a base de qualquer peça musical. Na música erudita do século XVIII, por exemplo, era muito comum elaborar estruturas melódicas por meio de arpejos.

Ou seja, compositores propunham, em muitos casos, que os acordes fossem tocados em forma de melodia, nota por nota. Esse recurso ainda é amplamente usado, inclusive como um tipo de ornamento.

A linha melódica pode ser estruturada, ainda, pelas notas mais agudas, mais graves ou centrais dos acordes.

A própria escala musical, por si só, também é uma melodia. Em uma escala de La maior, por exemplo, você pode pegar quaisquer notas aleatoriamente e já montar a linha melódica de sua composição.

Outro aspecto relevante à construção melódica diz respeito aos tipos de melodia:

  • Por graus conjuntos: os graus são as notas que fazem parte da escala. Quando estão conjuntos, significa que são vizinhos, ou seja, uma nota precede ou sucede imediatamente a outra. Exemplo: Do-Re-Mi.
  • Com predomínio de saltos: o salto nada mais é que saltar as notas da escala. Por exemplo: você pode começar a melodia em Do e ir direto para Sol, sem passar pelo Re, Mi e Fa.
  • Com graus conjuntos e saltos: combinação de ambos os itens anteriores. A melodia de “Parabéns pra Você”, por exemplo, traz muitos graus conjuntos, mas há também alguns saltos.

A “geometria” das vozes

Curiosamente, a estrutura de uma melodia pode seguir uma lógica “geométrica”, a partir do movimento de pelo menos duas vozes. Vamos visualizar na partitura como isso funciona.

Aqui, citaremos três desses movimentos. Mas existem outros. Na composição, vale destacar, esse entendimento é importante para a produção de arranjos musicais com vozes diversas. Confira:

  • Movimento paralelo: as duas vozes têm o mesmo intervalo entre elas e seguem a mesma direção na pauta.
partitura mostrando o movimento paralelo das vozes
  • Movimento direto: neste caso, as vozes se movimentam na mesma direção, mas o intervalo se altera.
Partitura mostrando movimento direto das vozes na melodia musical
  • Movimento oblíquo: uma das vozes se mantém sempre na mesma altura. Já a outra segue direções aleatórias, para cima ou para baixo.
Partitura mostrando o movimento oblíquo das vozes

“Gramática” musical

A melodia, além de analisada sob o ponto de vista de seu movimento, também pode ser compreendida de forma análoga ao que fazemos na língua portuguesa. Isso mesmo. É como se houvesse uma espécie de “gramática” na música.

Ficou confuso(a)? Calma, vamos esclarecer.

Imagine um texto qualquer. Ele é formado de várias frases, orações e períodos, certo? E você deve se lembrar disso quando frequentou as aulas de português na sua escola.

As melodias, assim como os textos, também contêm frases, as quais são definidas, neste caso, como trechos musicais com início, meio e fim. Em geral, duram de quatro a oito compassos.

Assim como na língua portuguesa, a frase musical não é feita de qualquer maneira. É preciso seguir algumas regras, que fazem parte da chamada “sintaxe musical”.

Segundo Bohumil Med, esse termo é definido como a “ordenação lógica da construção do discurso musical, ou seja, da melodia”.

Temos, então, além da frase, o motivo e o período.

Normalmente, o motivo é um pedacinho de uma frase. Mas não se trata de qualquer “pedacinho”. Esse pequeno trecho deve conter a identidade da música. Ou seja, você ouve e já identifica de imediato de qual obra se trata.

Quer ver um exemplo? Preste atenção no primeiro compasso de “Wish You Were Here”, de Pink Floyd. Ali está o “motivo” da canção. Você já consegue saber qual é a música nas primeiras notas.

O período, por sua vez, é geralmente formado por duas frases e com ideia conclusiva.

E como definir de forma correta quais as frases, períodos e o motivo de uma canção? Aí depende de muita prática e análise caso a caso.

Monofonia, homofonia e polifonia

Por fim, não poderíamos deixar de falar sobre os conceitos de monofonia, homofonia e polifonia, que são texturas dos arranjos musicais. A compreensão desses termos auxilia no entendimento das estruturas melódicas.

Quando você cantarola uma melodia qualquer, temos um exemplo de monofonia. É a forma melódica mais simples, com uma só voz, sem acordes, contracanto ou outro recurso que torne a obra mais complexa.

Essa única voz pode ser executada por várias pessoas. Não importa. Continua sendo uma melodia monofônica.

Já a homofonia pode ter dois significados.

O primeiro refere-se a vozes distintas e interdependentes executadas no mesmo ritmo, de forma uníssona.

Muitas peças musicais para corais são feitas desta maneira. Veja que, na relação entre essas vozes, são criados acordes. Ou seja, existe harmonia na homofonia!

Outro conceito do termo diz respeito a uma melodia principal executada com acompanhamento.

É o que ocorre em boa parte da música popular. Uma melodia acompanhada dos acordes de um violão é considerada uma homofonia.

Finalmente, temos a polifonia

Formada por duas ou mais melodias independentes, mas que criam uma relação harmônica dentro da peça musical.

Johann Sebastian Bach é uma das maiores referências na criação de composições polifônicas.

Mas vamos nos ater a um exemplo bem brasileiro. Trata-se da canção “Samba em Prelúdio”, de Vinicius de Moraes e Baden Powell.

Nas duas primeiras partes da música ocorre a homofonia, com melodia e acompanhamento. Um detalhe interessante: a melodia da primeira parte é bem diferente da segunda. Por isso, a sensação é de que ouvimos duas canções.

Em um terceiro momento, as vozes da primeira e segunda partes, mesmo tão distintas, “conversam” entre si, ao serem executadas simultaneamente. Temos aí a polifonia.

O último verso da música, por sua vez, traz as duas vozes se juntando em uníssono, numa única letra e melodia: “Sem você meu amor eu não sou ninguém”.

Viu só como a melodia pode ser analisada e estruturada de diversas maneiras? Continue acompanhando a gente, para mais curiosidades e conhecimento sobre o universo musical!

About Luciana Amaral

Luciana Amaral é cantora profissional, jornalista, revisora e redatora freelancer. Já participou de vários cursos de canto, como o Modern Mix Voice, do professor Caio Freire; Solte Seu Belting, do professor André Barroso; Canto Popular, durante o Curso Internacional de Verão da Escola de Música de Brasília (Civebra); e Congresso Online de Voz Cantada, realizado pela Faculdade Novo Horizonte e pela professora Flávia Caraíbas. https://www.instagram.com/luciana.amaral_cantora/

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